Por J. R. B. Farias, N. Neumaier e A. L. Nepomuceno

Dos fatores de produção agrícola, o clima figura como o de mais difícil controle e de maior impacto sobre a obtenção de máximas produtividades. A imprevisibilidade do clima confere às adversidades climáticas, o principal fator de risco e de insucesso na exploração da agricultura.

Estresses abióticos, como a seca, o excesso de chuvas, temperaturas muito altas ou baixas, baixa luminosidade, etc., podem reduzir significativamente os rendimentos em lavouras e restringir as áreas onde espécies comercialmente importantes podem ser cultivadas. Certas adversidades climáticas, como a falta de água, podem, em alguns casos, ser total ou parcialmente amenizadas, porém, não se pode cultivar economicamente plantas não adaptadas ao clima.

No contexto atual de mercados globalizados, incrementos nos rendimentos e redução nos custos e nos riscos são exigências básicas à competitividade. Maior eficiência no uso de recursos, melhoria na qualidade dos produtos e conservação dos recursos naturais, são desafios para a sustentabilidade da moderna agricultura. Entretanto, a maioria das culturas está sujeita à imprevisibilidade do clima, onde pouco pode ser feito em apoio ao produtor. Definindo áreas e épocas de semeadura menos sujeitas a riscos de insucesso pela ocorrência de adversidades climáticas, o zoneamento agroclimático constitui-se numa tecnologia de fundamental importância para a atividade agrícola. Com a caracterização climática das regiões produtoras de soja, a caracterização físico-hídrica dos solos e as exigências bioclimáticas da cultura, foi possível definir os locais e períodos de semeadura com menor risco de ocorrência de déficit hídrico à soja, utilizando como ferramentas a modelagem e simulação de sistemas, o geoprocessamento (SGIs) e a geoestatística.

Temperatura

A soja se adapta melhor às regiões onde as temperaturas oscilam entre 20°C e 30°C sendo que a temperatura ideal para seu desenvolvimento está em torno de 30°C. A semeadura da soja não deve ser realizada quando a temperatura do solo estiver abaixo dos 20°C, pois a germinação e a emergência da planta ficam comprometidas. A faixa de temperatura do solo adequada para a semeadura varia entre 20°C a 30°C, sendo 25°C a temperatura ideal para uma emergência rápida e uniforme.

Regiões com temperaturas menores ou iguais a 10°C graus são impróprias ao cultivo da soja, pois nesses locais, tanto o crescimento vegetativo quanto o desenvolvimento da soja é pequeno ou nulo. Por outro lado, temperaturas acima de 40°C têm efeito adverso na taxa de crescimento, provocam danos à floração e diminuem a capacidade de retenção de vagens. Esses problemas são acentuados com a ocorrência concomitante de déficits hídricos (Farias et al., 2007). Na Figura 3, são apresentadas a faixa térmica ideal ao desenvolvimento da cultura da soja e alguns efeitos decorrentes de temperaturas abaixo e acima da faixa ideal.

Figura 3. Faixa térmica ideal ao desenvolvimento da cultura da soja e alguns efeitos decorrentes de temperaturas baixas e elevadas.

A floração da soja é induzida quando ocorrem temperaturas acima da temperatura base, que é variável de cultivar para cultivar. As diferenças de data de floração, entre anos, apresentadas por uma cultivar semeada em uma mesma época, num mesmo local, são devido às variações de temperatura. Assim, a soja floresce antes do tempo quando ocorrem altas temperaturas, o que pode acarretar diminuição na altura da planta. As diferenças de datas de floração entre cultivares, semeadas em uma mesma época de um mesmo ano, são devido à resposta diferencial das cultivares, principalmente ao fotoperíodo.

A maturação pode ser acelerada pela ocorrência de altas temperaturas. A qualidade das sementes é afetada negativamente sob altas temperaturas e alta umidade. Tempo quente associado a períodos de baixa umidade, predispõem as sementes ao “enrugamento” e a danos mecânicos durante a colheita. Temperaturas baixas na fase de maturação, associadas aos períodos chuvosos ou de alta umidade, podem provocar atraso na data da colheita, bem como haste verde e retenção foliar.
Para a produção de sementes de soja com qualidades fisiológica e sanitária superiores, são indicadas regiões com temperaturas do ar mais amenas (inferiores a 22°C) durante a fase de maturação da cultura (Costa et al., 1994).

O tombamento fisiológico, também conhecido como cancro de calor, caracteriza-se por plântulas tombadas com lesão de estrangulamento do hipocótilo no nível da superfície do solo e pela ausência de patógenos. Logo após a emergência, quando as plântulas ainda estão em VE ou VC, temperaturas da superfície do solo acima de 55 °C podem desestruturar as membranas das células e desidratar os tecidos do colo da planta causando o tombamento fisiológico ou cancro de calor (Figura 4). O superaquecimento da superfície do solo acontece, normalmente, nas primeiras horas da tarde, de dias sem vento, quando as temperaturas máximas do ar alcançam 35 °C ou mais e a radiação solar incidente na superfície do solo é intensa. Observações empíricas mostraram que esse problema é mais freqüente em solos sujeitos ao aquecimento superficial, como solos sem cobertura, arenosos e compactados. Não se tem notícia de cultivares tolerantes. A semeadura direta bem executada, com boa cobertura de palha, é uma prática que pode prevenir o aparecimento do problema. Não há tratamento curativo, a não ser, nos casos extremos, a ressemeadura da parte afetada da lavoura.

Figura 4. Plântulas no campo, apresentando lesões de escaldadura no hipocótilo e tombamento fisiológico causados por altas temperaturas na superfície do solo (foto: cortesia de José Nunes Jr).

De forma geral, a temperatura mínima a partir da qual ocorre o desenvolvimento das cultivares brasileiras de soja é de cerca de 13oC. As diferenças de data de floração, entre anos, apresentadas por uma cultivar semeada em uma mesma época são devido às variações de temperatura. Assim, a soja adianta o florescimento quando ocorrem altas temperaturas, o que pode acarretar diminuição na altura da planta. Este problema pode ser agravado se, ao mesmo tempo, ocorrer insuficiência hídrica e/ou fotoperiódica durante a fase de crescimento. Diferenças de data de floração entre cultivares, numa mesma época de semeadura, num mesmo local, são devidas principalmente, à resposta diferencial das cultivares ao fotoperíodo. A soma térmica, utilizada principalmente para quantificar as disponibilidades térmicas regionais, não tem apresentado resultados consistentes para a avaliação da aptidão à soja, devido ao efeito do fotoperíodo, que participa com parcela muito significativa no controle do desenvolvimento da planta.

Temperatura base: é a temperatura abaixo da qual a taxa de desenvolvimento da soja é zero, isto é, abaixo da qual a planta não se desenvolve.

Radiação

A radiação solar é um importante componente ambiental que, além de fornecer energia luminosa para a fotossíntese, também fornece sinais ambientais para uma gama de processos fisiológicos da soja. Nesse contexto, além da intensidade da radiação, a duração e a qualidade do espectro luminoso são determinantes de respostas morfológicas e fenotípicas marcantes em soja, tais como estatura da planta, indução ao florescimento e ontogenia (Thomas,1994). Na Figura 5 é possível verificar o efeito de níveis de sombreamento no decréscimo do rendimento da soja (Wahua e Miller, 1978).

Figura 5. Decréscimos de rendimento da soja sob a ação de níveis de sombreamento, relativos à ausência de sombreamento (0% sombreamento = 100% rendimento de grãos) (adaptado de Wahua e Miller, 1978).

Contrariamente, em experimento onde o enriquecimento da radiação solar (através da inclinação a 45 graus das fileiras de bordadura) foi iniciado no final do período vegetativo e no início do florescimento, foi observado aumento do rendimento em 144 e 252%, respectivamente. Estes aumentos de rendimento foram devidos, principalmente, ao maior número de vagens. Quando o enriquecimento luminoso ocorreu no início da formação das vagens o aumento do tamanho da semente variou de 8 a 23%, resultando em 32 a 115% de aumento do rendimento (Mathew et al., 2000).

Em outro experimento de enriquecimento luminoso, foi observado maior taxa de crescimento da semente, maior peso seco de semente e maior número de células cotiledonares, enquanto que, com sombreamento, houve redução na taxa de crescimento da semente e no número de células cotiledonares, juntamente com significativa queda nos níveis de ABA endógeno na semente (Liu et al., 2006).

Fotoperíodo

A adaptação de diferentes cultivares a determinadas regiões depende, além das exigências hídricas e térmicas, de sua exigência fotoperiódica. Em maior ou menor escala, a indução ao florescimento, na grande maioria das cultivares, é determinada pelo fotoperíodo e é modulada pela temperatura. A sensibilidade ao fotoperíodo é característica variável entre cultivares, ou seja, cada cultivar possui seu fotoperíodo crítico (FC), acima do qual o florescimento é atrasado. Por esta razão, a soja é considerada planta de dia curto.

A sensibilidade ao fotoperíodo ainda é uma importante restrição para uma adaptação mais ampla da soja. Em função dessa característica, a faixa de adaptabilidade de cada cultivar é variável à medida que se desloca em direção ao norte ou ao sul. Na Figura 6 é apresentada a variação do fotoperíodo em função da latitude do local, verificando-se que quanto mais próximo da linha do equador menor é a amplitude do fotoperíodo ao longo do ano. A solução para o problema é a introdução do período juvenil longo. Cultivares que apresentam a característica “período juvenil longo” possuem adaptabilidade mais ampla, possibilitando sua utilização em faixas mais abrangentes de latitudes (locais) e de épocas de semeadura.

Figura 6. Fotoperíodo (h) ao longo do ano em função da latitude do local.

O período juvenil longo é uma fonte não tradicional de florescimento tardio. Uma cultivar de soja com período juvenil longo permanece vegetativa por mais tempo do que cultivares convencionais quando expostas a dias curtos, mas poderá florescer mais cedo do que algumas cultivares convencionais sob dias longos. Assim, as cultivares com período juvenil longo parecem ser menos sensíveis ao fotoperíodo do que a maioria das cultivares tradicionais. A fisiologia do modo de ação do período juvenil longo é ainda pouco conhecida. Não está exatamente claro como os genótipos que possuem essa característica respondem ao fotoperíodo, nem está claro se a característica induz um período juvenil verdadeiro, isto é, uma fase da planta na qual ela esta "inapta a florescer" ou se simplesmente condiciona uma menor sensibilidade ao fotoperíodo, de tal forma que um período fototérmico maior tenha que acontecer para que o florescimento seja induzido. Também não está esclarecido como a temperatura modula a expressão da característica e qual a influência da arquitetura genética nesta relação.

Água

A água constitui aproximadamente 90% do peso da planta, atuando em praticamente todos os processos fisiológicos e bioquímicos. Desempenha a função de solvente, através do qual gases, minerais e outros solutos entram nas células e movem se através da planta. Tem, ainda, papel importante na regulação térmica da planta, agindo tanto no resfriamento como na manutenção e na distribuição do calor. Na Figura 7, são apresentadas as principais funções da água.

Figura 7. Principais funções da água na planta.

A disponibilidade de água é importante, principalmente em dois períodos de desenvolvimento da soja: germinação emergência e floração-enchimento de grãos. Durante o primeiro período, tanto o excesso como a falta de água é prejudicial ao estabelecimento da cultura e à obtenção de uma boa uniformidade na população de plantas, sendo o excesso hídrico mais limitante do que o déficit. A semente de soja necessita absorver, no mínimo, 50% de seu peso em água para assegurar uma boa germinação. Nessa fase, o conteúdo de água no solo não deve exceder a 85% do total máximo disponível e nem ser inferior a 50% (Embrapa Soja, 2008). A necessidade de água na cultura da soja vai aumentando com o desenvolvimento da planta, atingindo o máximo durante a floração - enchimento de grãos (7 a 8 mm/dia), decrescendo após esse período (Figura 8).

Figura 8. Evapotranspiração (ET) diária da cultura da soja nos diferentes estádios de desenvolvimento. Adaptado de Berlato et al. (1986).

Em geral, o consumo mais elevado de água coincide com o período em que a cultura apresenta maiores altura e índice de área foliar. A necessidade total de água na cultura da soja, para obtenção do máximo rendimento, varia entre 450 a 800 mm/ciclo, dependendo das condições climáticas, do manejo da cultura e da duração do seu ciclo. Como o consumo de água pela cultura da soja depende, além do estádio de desenvolvimento, da demanda evaporativa da atmosfera, o seu valor absoluto pode variar, tanto em função das condições climáticas de cada região como em função do ano e da época de semeadura (condições de tempo) na mesma região climática.

O conhecimento da evapotranspiração máxima (consumo de água em condições de ótima disponibilidade hídrica no solo) das plantas cultivadas, nos diversos períodos de desenvolvimento e ao longo de todo o seu ciclo, é de grande importância para o manejo da água na agricultura irrigada. Em cultivos não irrigados, essa informação também é muito útil na tomada de decisão sobre a adoção de práticas culturais que permitam melhor aproveitamento das disponibilidades hídricas naturais de cada região. Um exemplo disso é a definição das épocas de semeadura, de modo a evitar que os períodos críticos, em relação à água, coincidam com períodos de menor disponibilidade de água à cultura.

Perdas por seca

A cultura da soja, para apresentar um bom desempenho, necessita, além de um volume de água adequado, uma boa distribuição das chuvas ao longo do ciclo, satisfazendo suas necessidades, principalmente, durante as fases mais críticas. Na figura 9, são apresentados os fatores determinantes da produtividade em soja.

Figura 9. Fatores determinates da produtidade em soja.

Apesar do vasto conhecimento para o cultivo da soja, resultando em elevado grau de tecnificação da maioria das lavouras brasileiras, a disponibilidade hídrica durante a estação de crescimento constitui-se, ainda, na principal limitação à expressão do potencial de rendimento da cultura e na maior causa de variabilidade dos rendimentos de grãos observados de um ano para outro, principalmente, no sul do Brasil. Para exemplificar, somente na safra 2004/2005, as perdas de rendimento de grãos nos estados do RS e do Paraná atingiram mais de 78 e 23%, respectivamente, quando comparadas à safra 2002/2003, onde não ocorreram problemas de seca (Tabela 1). Nas regiões e estados com uma boa distribuição e volume de chuvas, como Mato Grosso, os rendimentos de grãos são mais uniformes, sem perdas expressivas (Tabela 1).

Tabela 1. Variações percentuais da área plantada, produção total e rendimento de grãos de soja observados no Mato Grosso, Paraná, Rio Grande do Sul e Brasil, entre as safras 2004/2005 (com problemas de seca) e 2002/2003 (sem ocorrência de secas significativas).

Analisando-se a Tabela 2, pode-se verificar que as perdas decorrentes de seca somente nos estados do Paraná e Rio Grande do Sul foram responsáveis por mais de 80% das perdas totais da produção brasileira de soja para a safra 2004/2005. As implicações são enormes uma vez que, não somente produtores, mas toda a sociedade é afetada. Na Figura 10, observa-se as quedas dos rendimentos da soja em anos de seca no estado do Rio Grande do Sul. As implicações dessas secas são enormes uma vez que, não somente produtores, mas toda a sociedade é afetada..
 
Tabela 2. Produção de grãos de soja estimada para safra 2004/2005 (PE2005) em função da área plantada na safra 2004/2005 e dos rendimentos obtidos em 2002/2003, e quebra da safra estimada em 2004/2005 em função da produção obtida nessa safra (Prod2005), no Paraná, Rio Grande do Sul e Brasil.
 
 
Figura 10. Evolução da área plantada e rendimento de grãos no RS.

Necessidades de Água

Em trabalhos realizados em Londrina-PR, ao longo de 15 safras, avaliando-se diversas cultivares sob diferentes condições de disponibilidade hídrica, verificou-se que os maiores rendimentos de grãos de soja foram obtidos com 650 a 700mm de água, bem distribuídos em todo o ciclo (Figura 11).

Figura 11. Rendimento de grãos de soja em função do aporte de água durante todo o ciclo, em diversas safras, sob condições irrigada, não irrigada e com déficit hídrico (DH) durante as fases reprodutiva (Rep) e vegetativa (Veg).

Observou-se ainda que nos níveis com aplicação de déficit hídrico durante as fases vegetativa e reprodutiva, apesar do volume total de água durante todo o ciclo ter atingido valores próximos a 700mm, os rendimentos alcançados não foram tão altos em função da má distribuição da precipitação, principalmente, durante a fase mais crítica (período reprodutivo), limitando drasticamente a obtenção de elevados rendimentos de grãos. Por outro lado, o excesso de chuva e dias nublados podem prejudicar a fotossíntese, o arejamento do solo, o desenvolvimento das raízes e a fixação de nitrogênio, interferir em outros processos e causar várias anomalias no desenvolvimento da soja, reduzindo o rendimento de grãos. O volume de água ideal para atender as necessidades da cultura da soja durante a fase crítica (R1-R6) situou-se entre 120 a 300 mm (Figura 11), bem distribuídos ao longo deste período (variando de 30 a 60 dias, a partir do início da floração, em função da cultivar e das condições climáticas durante a estação de crescimento). Da mesma forma que na Figura 12, observa-se que volumes de água de igual magnitude, porém, muito mal distribuídos, também limitaram a obtenção de altos rendimentos. Desta forma, ficou evidente que, para garantir máximo rendimento de grãos, o volume de água necessário deve ser disponibilizado ao longo de todo o ciclo, a fim de atender as exigências da cultura, podendo ser suprido através da chuva, da irrigação e/ou do armazenamento de água pelo solo.

Figura 12. Rendimento de grãos de soja em função do aporte de água durante a fase mais crítica à falta de água (R1-R6), em diversas safras, sob condições: irrigada, não irrigada e com déficit hídrico (DH) durante as fases reprodutiva (Rep) e vegetativa (Veg).

Cabe ressaltar que a ausência de chuvas, isoladamente, não significa, obrigatoriamente, ocorrência de déficit hídrico. A planta busca um ajuste entre a absorção de água e a transpiração. O limite a este ajustamento representa o início do déficit hídrico. Toda a dinâmica da água no sistema solo-planta-atmosfera ocorre em função da demanda evaporativa da atmosfera (DEA), que, em última análise, determina a magnitude da perda de água por transpiração e, conseqüentemente, a necessidade de absorção pelas raízes (Bergamaschi et al., 1999). A transpiração ocorre, então, em função da DEA e, de forma prática, o déficit hídrico tem início quando a transpiração da planta começa a ser limitada pela disponibilidade de água no solo. A capacidade de armazenamento de água disponível no solo (CAD) é expressa pela diferença entre os limites máximo (capacidade de campo) e mínimo (ponto de murcha permanente) de água disponível, multiplicada pela profundidade efetiva do sistema radicular. Solos de textura mais fina (mais argilosos) retêm maior quantidade de água do que solos com partículas mais grossas. Práticas que favoreçam à melhor estruturação do solo e o aprofundamento do sistema radicular contribuem para incrementar o armazenamento de água no solo e, conseqüentemente, sua CAD. Em regiões com distribuição irregular das chuvas e elevada demanda evaporativa da atmosfera (caracterizadas pela ocorrência de elevada radiação solar, ventos fortes, altas temperaturas e baixa umidade relativa do ar), a disponibilidade hídrica no solo passa a ser fundamental para assegurar sucesso à exploração agrícola, principalmente, na ausência de irrigação.

Sintomas da Falta de Água

O estresse causado por deficiência de água determina a presença de plantas pouco desenvolvidas, de pequena estatura, com folhas pequenas e entrenós curtos. Os tecidos vegetais apresentam-se com aspecto de murchos e os folíolos tendem a “fechar” para diminuir a área foliar exposta. As secas severas, na fase vegetativa, reduzem o crescimento da planta e diminuem a área foliar e o rendimento de grãos.

Secas durante o período reprodutivo causam reduções mais drásticas no rendimento de grãos, sendo a ocorrência de deficit hídrico durante o período de enchimento dos grãos mais prejudicial do que durante a floração. Deficits hídricos expressivos, durante a floração e o enchimento de grãos, provocam alterações fisiológicas na planta, como o fechamento estomático e o enrolamento de folhas e, como conseqüência, aumentam a queda prematura de flores e ocasionam o abortamento de vagens e “chochamento” de grãos, com a conseqüente diminuição do número de vagens e o aparecimento de vagens vazias ou “chochas”. O abortamento de vagens não é plenamente compensado pelo número de grãos/vagem e pelo peso do grão, pois esses componentes do rendimento possuem limites máximos geneticamente determinados. Entretanto, alguma compensação no peso do grão é sempre possível, no caso das condições hídricas normalizarem-se a tempo de proporcioná-la. As secas podem diminuir a taxa de acúmulo de matéria seca nos grãos (g/planta/dia) e apressar a maturação, fazendo com que os grãos produzidos sob seca sejam menores. O efeito da ocorrência do déficit hídrico sobre o rendimento da cultura vai depender da intensidade e duração do déficit hídrico, da época de ocorrência, da cultura/cultivar, do estádio de desenvolvimento da planta e da interação com outros fatores determinantes do rendimento.

A caracterização dos mecanismos de inibição do crescimento das plantas pelo déficit hídrico constitui um problema de importância e real interesse. A umidade interna das plantas influencia muitos processos fisiológicos. Plantas sob estresse hídrico têm afetados a absorção de água, a germinação de sementes, o fechamento estomático, a transpiração, a fotossíntese, a atividade enzimática, o metabolismo do nitrogênio e outros processos. A maneira exata pela qual a falta de água afeta o crescimento e desenvolvimento da planta tem sido alvo de muitos debates. Há evidência de que o estresse hídrico afeta o crescimento através de mecanismos diretos e indiretos alterando relações hormonais e nutricionais e a formação de carboidratos. Ao longo da evolução, as plantas desenvolveram mecanismos com os quais têm sobrevivido aos estresses hídricos. Tais mecanismos variam entre espécies e dizem respeito a tolerar, escapar e evitar o déficit hídrico. No primeiro caso, a planta sobrevive sob elevados estresses hídricos internos; no segundo, a planta completa o ciclo antes de períodos de seca; e, no terceiro caso, a planta mantém um potencial elevado de água nos tecidos.

O estresse hídrico prejudica a atividade fotossintética, pelo fechamento estomático e a conseqüente diminuição da assimilação de CO2. Somente deficiências mais drásticas afetam o processo fotossintético de redução do carbono. Déficits moderados não prejudicam as reações fotossintéticas nos cloroplastos.

Indicações para Redução das Perdas por Seca

Para que uma planta tenha boas condições de sobreviver, em regiões onde há pouca disponibilidade de água, ela deve ser capaz de manter uma condição hídrica superior durante as horas mais críticas do dia, quando a demanda evaporativa da atmosfera é alta, estando isso associado com um sistema radicular bem desenvolvido.

A chuva é a principal fonte de água para a maior parte da produção de soja mundial. Apesar de eficazes, poucos são os agricultores que dispõem de sistemas de irrigação para suplementar as necessidades de água da cultura, em função do elevado custo de tais sistemas. Apesar dos grandes prejuízos advindos da ocorrência de adversidades climáticas, pouco ou quase nada se tem para apresentar como solução ao produtor, sem aumentar seu custo de produção. Para minimizar os efeitos do déficit hídrico, indica-se semear apenas cultivares adaptadas à região e à condição de solo, semear em época recomendada e de menor risco climático, semear com adequada umidade em todo o perfil do solo e adotar práticas que favoreçam o armazenamento de água pelo solo (ex.: controle de ervas daninhas, aumento de matéria orgânica, semeadura direta, etc.). Deve-se evitar semear em épocas de risco indicadas pelo zoneamento agroclimático.

Imenso progresso tem sido conseguido na adaptação da soja para a obtenção de altos rendimentos em áreas de baixa latitude. A limitação do fotoperíodo foi eliminada através de seleção cuidadosa e desenvolvimento de germoplasma menos sensível ao fotoperíodo. O baixo pH e a alta disponibilidade de alumínio nos solos foram superados, principalmente, pela calagem. Atualmente, é provável que o principal fator que limita os rendimentos em áreas de baixa latitude seja a disponibilidade de água nos solos. Os rendimentos são extremamente dependentes da água disponível e, desta forma, provavelmente, será necessário aumentar a disponibilidade de água para atender a transpiração da cultura e, conseqüentemente, obter-se incrementos na produtividade. Maior profundidade do sistema radicular parece ser crítico à obtenção de rendimentos crescentes sob condições limitantes de água. Por conseguinte, aumento na profundidade das raízes, em direção às camadas do solo com baixo pH e alto alumínio disponível é um grande desafio (Sinclair e Purcell, 2002). No sul do Brasil, o maior entrave à expressão de altos rendimentos tem sido a variabilidade na distribuição de chuvas durante o período de primavera-verão (Cunha et al, 1998). Então, no futuro, muito do potencial para obtenção de altos rendimentos, provavelmente, será resultado da maior disponibilidade de água às culturas.

Previsões ambientais sinalizam para o aumento do aquecimento global nas próximas décadas. Alterações climáticas certamente acompanharão esse evento. As dificuldades para alimentar a população mundial, em crescimento acelerado, usando apenas tecnologias tradicionais, serão imensas. O desenvolvimento de cultivares mais tolerantes às adversidades climáticas, como por exemplo, à seca, será essencial e a disponibilidade de novas ferramentas de pesquisa, nas áreas de ecofisiologia e biotecnologia vegetal, possibilitam estudar e compreender com maior detalhe os processos envolvidos nas respostas fisiológicas e agronômicas das culturas. Somente com o investimento crescente e continuado em pesquisa agropecuária é que será possível garantir o alimento em quantidade e qualidade às gerações futuras.

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Mais Informações

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Agritempo: www.agritempo.gov.br
MAPA: www.agricultura.gov.br